sexta-feira, 16 de maio de 2025

"Guardião da Criação: A Vocação do Homem na Harmonia entre Fé, Clima e Natureza"

 A teologia católica oferece uma visão rica e profunda sobre a relação do ser humano com o clima e com o planeta Terra, fundamentada tanto na Sagrada Escritura quanto no ensinamento do Magistério da Igreja, especialmente no Catecismo da Igreja Católica (CIC) e em documentos recentes como a encíclica Laudato Si’ do Papa Francisco.

1. A Criação como dom de Deus

A teologia católica afirma que o mundo criado é obra de Deus e expressão de Seu amor:

“No princípio, Deus criou o céu e a terra” (Gênesis 1,1).

Toda a criação é boa e reflete a glória de Deus (cf. Gn 1,31; Sl 19,1). O ser humano, criado à imagem e semelhança de Deus (Gn 1,26-27), é chamado a viver em comunhão com o Criador e a cuidar de sua criação.

O Catecismo diz:

“A criação tem sua bondade e perfeição próprias. [...] Deus quis a diversidade de suas criaturas e a sua própria bondade, interdependência e ordem” (CIC 339).

2. O homem como guardião da criação

Deus confiou ao homem a missão de “dominar” e “cultivar e guardar” a terra (Gn 1,28; 2,15). Isso não significa exploração desenfreada, mas uma responsabilidade cuidadosa:

 “O domínio concedido pelo Criador ao homem não é absoluto, nem se pode falar de liberdade de ‘usar e abusar’, ou de dispor das coisas como convier” (CIC 373).

Essa missão implica responsabilidade moral diante de Deus, das futuras gerações e das demais criaturas. O Papa Francisco afirma:

“Somos chamados a ser os instrumentos de Deus Pai para que o nosso planeta seja o que Ele sonhou ao criá-lo” (Laudato Si’, 53).

3. O pecado e suas consequências ecológicas

O pecado original desordenou não apenas a relação do homem com Deus, mas também com a criação. O Catecismo reconhece que:

“A harmonia em que viviam, graças à justiça original, é destruída; o domínio das faculdades espirituais da alma sobre o corpo é rompido; a união entre o homem e a mulher é submetida a tensões; suas relações serão marcadas pela concupiscência e pela dominação. A criação visível tornou-se estranha e hostil para o homem” (CIC 400).

Assim, as consequências do pecado incluem desequilíbrios ambientais, sociais e espirituais, que se manifestam hoje na crise ecológica e climática.

4. Conversão ecológica e justiça climática

O Papa São João Paulo II já falava da necessidade de uma “conversão ecológica”. O Papa Francisco aprofunda esse chamado:

“Os desequilíbrios ecológicos e sociais têm as mesmas raízes: a arrogância de se colocar no lugar de Deus, acreditando-se no direito de dominar a Terra sem limites” (Laudato Si’, 117).

A crise climática é vista como uma questão moral e de justiça social, pois afeta desproporcionalmente os pobres e vulneráveis. A fé exige uma resposta concreta:

“Viver a vocação de ser protetores da obra de Deus é parte essencial de uma existência virtuosa” (Laudato Si’, 217).

5. Esperança e redenção da criação

A criação não está abandonada, mas caminha rumo à redenção final:

“A própria criação será libertada da escravidão da corrupção, para entrar na liberdade da glória dos filhos de Deus. [...] Toda a criação geme e sofre dores de parto até agora” (Romanos 8,21-22).

Essa expectativa escatológica não leva à passividade, mas ao cuidado diligente, pois esperamos “um novo céu e uma nova terra” (Ap 21,1), que começam a ser preparados já neste mundo.

O cuidado com o clima e com o planeta não é uma questão secundária, mas parte essencial do discipulado cristão. Trata-se de um ato de fé, justiça, esperança e amor.


Por Léo Tenório 
( Teólogo e Missionário da comunidade católica Chama/PE)



sábado, 3 de maio de 2025

A Vida Agitada e o Desafio da Oração no Mundo Moderno

Vivemos em uma era marcada pela correria, pelo excesso de informações e pelas múltiplas exigências da vida profissional, familiar e social. O homem moderno, imerso em agendas lotadas, trânsito, metas e tecnologia constante, muitas vezes se vê sufocado pelo ritmo acelerado do dia a dia. Nesse cenário, algo precioso corre o risco de ser deixado de lado: a comunhão com Deus por meio da oração.

A oração, que deveria ser prioridade para o cristão, muitas vezes é empurrada para os momentos finais do dia — quando o cansaço já dominou o corpo e a mente. No entanto, a Bíblia nos alerta sobre a importância de manter um relacionamento contínuo com o Senhor. O apóstolo Paulo exorta: "Orai sem cessar" (1 Tessalonicenses 5,17). Essa instrução não significa estar o tempo todo de joelhos, mas viver em constante comunhão com Deus, reconhecendo Sua presença em todos os momentos.

Jesus é o maior exemplo de vida de oração. Mesmo sendo o Filho de Deus, Ele se retirava para lugares solitários a fim de orar. Em Marcos 1,35 lemos: "De madrugada, ainda bem escuro, Jesus levantou-se, saiu de casa e foi para um lugar deserto, onde ficou orando." Se o próprio Cristo, em meio a uma agenda cheia de ministério, milagres e ensinamentos, achava tempo para orar, quanto mais nós devemos buscar esse momento com Deus?

A vida moderna tenta nos convencer de que não temos tempo. No entanto, a verdade é que sempre encontramos tempo para o que consideramos prioridade. Jesus alertou Marta, preocupada com muitas tarefas, enquanto sua irmã Maria escolheu estar aos Seus pés ouvindo: "Marta, Marta, estás ansiosa e afadigada com muitas coisas, mas uma só é necessária; e Maria escolheu a boa parte, a qual não lhe será tirada" (Lucas 10,41-42). Esse texto nos desafia a rever nossas prioridades e a valorizar o tempo com Deus.

Para vencer a falta de tempo, é necessário disciplina e intencionalidade. Acordar um pouco mais cedo, usar momentos de deslocamento para orar silenciosamente ou aproveitar pausas no trabalho são maneiras práticas de manter a comunhão. O importante é não deixar que a rotina nos roube o essencial: a intimidade com o Pai.

A oração é mais do que um dever; é um privilégio. É nela que encontramos direção, consolo, força e paz. Como disse Davi: "Pela manhã ouvirás a minha voz, ó Senhor; pela manhã apresentarei a ti a minha oração e vigiarei" (Salmos 5,3).

Que mesmo em meio à agitação da vida moderna, possamos fazer como Jesus, como Davi, como Maria: escolher a boa parte, separar tempo para falar com Deus e, acima de tudo, ouvi-Lo.


Léo Tenório ( Teólogo e missionário da comunidade católica Chama/PE)

quinta-feira, 1 de maio de 2025

São José Operário e a Vida Cristã: O Exemplo do Trabalho com Fé e Humildade

No dia 1º de maio, a Igreja celebra a memória de São José Operário, patrono dos trabalhadores e modelo de virtude cristã no trabalho. Esta celebração, instituída pelo Papa Pio XII em 1955, une a fé cristã ao valor do trabalho humano, em resposta às lutas sociais e ao desejo de dignidade para os trabalhadores, especialmente à luz da Doutrina Social da Igreja.

Quem foi São José Operário?

São José, esposo da Virgem Maria e pai adotivo de Jesus, é uma das figuras mais silenciosas e, ao mesmo tempo, mais impactantes do Evangelho. Ele não pronuncia uma só palavra registrada nas Escrituras, mas suas ações falam com eloquência. Era carpinteiro, homem justo, obediente à vontade de Deus e trabalhador incansável. Viveu uma vida simples em Nazaré, sustentando sua família com o esforço de suas mãos e com profunda confiança em Deus.

A escolha de São José como operário não é casual. A carpintaria, ofício humilde e essencial, simboliza o valor do trabalho honesto e o papel santificador do esforço humano. Nele, vemos como o trabalho pode ser um meio de servir a Deus e à humanidade, com amor e dedicação.

A Vida Cristã à Luz de São José

A vida cristã é, acima de tudo, um caminho de santidade no cotidiano. São José nos ensina que não é preciso grandes gestos públicos ou milagres para ser santo; a fidelidade no silêncio, a paciência no trabalho e a confiança em Deus em cada situação bastam. Sua vida é um testemunho de que a santidade pode ser vivida no lar, no ofício, na simplicidade.

A Igreja vê no trabalho não apenas um meio de sustento, mas também um caminho de cooperação com a obra criadora de Deus. Como afirma São João Paulo II na encíclica Laborem Exercens, “o trabalho é uma participação do homem na obra da criação”. São José é o ícone dessa participação: cooperou com Deus não só criando com as mãos, mas educando o Filho de Deus em humanidade.

Atualidade da Mensagem

Num mundo em que o trabalho muitas vezes é visto apenas como fonte de lucro ou status, São José nos lembra do valor humano e espiritual do trabalho. Ele inspira trabalhadores e trabalhadoras a viverem sua vocação com dignidade, amor e propósito. Também nos exorta a proteger a família, viver com retidão e confiar na Providência Divina, mesmo nos momentos de incerteza.

Conclusão

São José Operário é modelo de fé encarnada na rotina, exemplo de vida cristã que transforma o ordinário em extraordinário. Ao celebrarmos sua memória, somos chamados a redescobrir o valor do trabalho à luz do Evangelho, buscando em nossas tarefas diárias uma oportunidade de servir a Deus e ao próximo com humildade e amor.


Léo Tenório 
(Teólogo e missionário da comunidade católica Chama)

"Guardião da Criação: A Vocação do Homem na Harmonia entre Fé, Clima e Natureza"

 A teologia católica oferece uma visão rica e profunda sobre a relação do ser humano com o clima e com o planeta Terra, fundamentada tanto n...